28 de ago. de 2009

"E sempre penso que foi a ultima vez que beijei na boca, de lingua, com gosto - God! - tá fazendo um ano... Sexo, a proposito, nada. Só mental, e o tempo todo. No verão fica ainda mais dificil, you know, dá aquela moleza. E tem as camisas abertas pelas ruas, os cheiros. Deus não devia ter inventado o sexo."
Caio F. Abreu
26 de ago. de 2009

Abre a porta. Espia, os olhos meio estrábicos no medo de ver o bilhete que não existe sobre o assoalho vazio. Joga as roupas numa cadeira. Apóia o corpo na janela. Acende um cigarro. Espia a rua, as pessoas, a noite que se cumpre mais uma vez. Liga o rádio. Não ouve a música. Os olhos se turvam, por dentro uma coisa aperta num jeito de quem estrangula. Não pode gritar. As paredes se dobram, fremem, prenhes de ironia. Suspira. Exausto.
Caio F.

O sol coado pelas persianas. Uma brecha de luz em cima da mesa. A sombra de seu perfil na parede. Amassa várias folhas de papel, joga-as no chão, gesto brusco. Você sabe que vai ser sempre assim. Que essa queda não é a última. Que muitas vezes você vai cair e hesitar no levantar-se, até uma próxima queda. Prefere jogar-se numa atitude que seria teatral, não fosse verdadeira, sentir os espinhos rasgando carne, as pedras entrando no corpo, o rosto espatifado contra o fim desconhecido. Precisa ir até o fundo.
Caio F.

As indagações pesavam sem resposta, e numa lucidez desesperada eu num repente assimilava todos os detalhes, dissecava o que acontecia em tomo como se tivesse mil olhos, envelhecia como a noite lá fora, virando madrugada, a luz fraca -eu tudo compreendia, tudo sabia. Menos aquela cabeça pesando no meu braço. Que espécie de busca o levara àquele gesto? Me quebrava por dentro, a cabeça afundando cada vez mais no meu corpo, eu negava, fugia, tenso, o cigarro morto nas mãos, a cinza caindo s'obre o tapete.
Caio F.
25 de ago. de 2009

"Vou te dizer o que eu nunca te disse antes, talvez seja isso o que está faltando: ter dito. Se eu não disse, não foi por avareza de dizer, nem por minha mudez de barata que tem mais olhos que boca. Se eu não disse é porque não sabia que sabia — mas agora sei. Vou-te dizer que eu te amo. Sei que te disse isso antes, e que também era verdade quando te disse, mas é que só agora estou realmente dizendo."
[C.L]

"Para ver você feliz, escrevo dias ensolarados. Espalho aquarela para pintar o céu com cores favoritas. Troco luneta. Faço caleidoscópio para observar estrelas e inventar constelações de meio-dia. Para ver você feliz penso em planos mirabolantes para camuflar pequenas surpresas nas inevitáveis rotinas.Para ver você feliz, te distraio com realidades fantásticas enquanto os furacões da vida normal passam. É só isso que posso fazer. Tempo ruim é meteorológico e se você conseguir enxergar esperança, até a chuva tem sua sombra feita de arco íris."
Tiago Yonamine

(...) todos os relógios estão parados, não sei se é ontem, se hoje ou amanhã, se é sempre, e nunca mais, estou solta aqui, completamente só, não há relógios, não há relógios e o tempo avança liberto, sem fronteiras nem limitações, uma bola de arame farpado, o sentimento vai se adensando em mim, transborda dos olhos, das mãos, sai pela boca em forma de fumaça, sinto meus lábios ressequidos, machucados, o gosto amargo, a bola cresce estendendo tentáculos, no meio dela eu me encolho cada vez mais, presa num círculo que cresce até explodir na vontade contida de gritar bem alto, bem fundo, rouca, exausta, correndo, esmagando as folhas de um outro outono, de um outro tempo, ainda este, o tempo, o outono, a tarde, o mundo, a esfera, a espera em que estou pra sempre presa.
(Fotografia - Inventário do ir-remediável)
Caio Fernando Abreu.
11 de ago. de 2009

"Quando fecho os olhos, é você quem eu vejo; aos lados, em cima, embaixo, por fora e por dentro de mim. Dilacerando felicidades de mentira, desconstruindo tudo o que planejei, abrindo todas as janelas para um mundo deserto. É você quem sorri, morde o lábio, fala grosso, conta histórias, me tira do sério, faz ares de palhaço, pinta segredos, ilumina o corredor por onde passo todos os dias.”
(Caio Fernando Abreu)
6 de ago. de 2009

Queria só um abraço, sabe? Eu só queria um abraço. Não seu nem de ninguém que exista agora. De alguém. A eterna espera por esse abraço, simples, apenas uma droga de abraço que aceite numa só a deusa, a menina de festa querendo dar e outras milhares de coisas que eu, juro, não são tão ruins assim. Então não era você que eu esperava? Não! Eu esperava alguém que pudesse só me abraçar por um tempo maior que esses socorros rápidos que arrumo quando grito mais alto.
Tati Bernardi

Porque eu, fulano, sou deusa. Apesar de você ter merecido só a menina da festa querendo dar. E apesar de saber que ser deusa pro cara que eu amava tinha me feito sentir mais lixo do que ser uma vadia pra você. A vida, fulano, é duríssima. Muito mais dura do que essa coisa meia-bomba que você trouxe aqui pra minha casa. Suma!
No dia seguinte eu botei tudo pra lavar. Eu só queria me divertir um pouco. Mas nada pode. Se você quer amar, não pode, a coisa vira toda contra você. É coisa de mulher chata. Se você quer dar, também não pode não. É coisa de vadia. O mundo é um lixo com as mulheres. E minha mente tem esse mundo aqui dentro. Esse lixo. Não queira nada, mulher! Apenas diga não e tenha o mundo aos seus pés. E dane-se se sua alma é dessas querendo dizer sim pra ser honesta e com bode do não de quem faz charme e não faz o que quer. Ser de verdade traz uma dor de verdade e só.
Tati Bernardi

(...) O que dá sempre tudo na mesma e infinita merda que é: viver cansa mas depois que a gente caga dá fome de novo. (...) Daqui a pouco o coração estraga tudo, troca de lugar com o cu, e eu vou novamente ter o apetite anoréxico de quem não suporta a vida. (...) Minha imagem é de uma criança de bochecha gorda batendo com os talheres. Venham! Venham! Venham!
Tati Bernardi

"Eu vou porque é preciso ter histórias, viver coisas, sair de casa, mas nunca vou realmente. Sempre me sinto ocupando de favor o lugar da personagem real que está doente ou enlouqueceu. Assim que coloco o pé pra fora, viro uma substituta de qualquer um que sabe viver. Uma coadjuvante de mim que rouba a cena porque os engracados sempre roubam."
Tati Berbardi
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