28 de fev. de 2009

Fragmento 262.
Cheguei hoje, de repente, a uma sensação absurda e justa. Reparei, num relâmpago íntimo, que não sou ninguém. Ninguém, absolutamente ninguém. Quando brilhou o relâmpago, aquilo onde supus uma cidade era um plaino deserto; e a luz sinistra que me mostrou a mim não revelou céu acima dele. Roubaram-me o poder ser antes que o mundo fosse. Se tive que reencarnar, reencarnei sem mim, sem ter eu reencarnado. Sou os arredores de uma vila que não há, o comentário prolixo a um livro que não se escreveu. Não sou ninguém, ninguém. Não sei sentir, não sei pensar, não sei querer. Sou uma figura de romance por escrever, passando aérea, e desfeita sem ter sido, entre os sonhos de quem me não soube completar.
Penso sempre, sinto sempre; mas o meu pensamento não contém raciocínios, a minha emoção não contém emoções. Estou caindo, depois do alçapão lá em cima, por todo o espaço infinito, numa queda sem direcção, infinitupla e vazia. Minha alma é um maelstrom negro, vasta vertigem à roda de vácuo, movimento de um oceano infinito em torno de um buraco em nada, e nas águas que são mais giro que águas bóiam todas as imagens do que vi e ouvi no mundo - vão casas, caras, livros, caixotes, rastros de música e sílabas de vozes, num rodopio sinistro e sem fundo. E eu, verdadeiramente eu, sou o centro que não há nisto senão por uma geometria do abismo; sou o nada em torno do qual este movimento gira, só para que gire, sem que esse centro exista senão porque todo o círculo o tem. Eu, verdadeiramente eu, sou o poço sem muros, mas com a viscosidade dos muros, o centro de tudo com o nada à roda.
E é, em mim, como se o inferno ele-mesmo risse, sem ao menos a humanidade de diabos a rirem, a loucura grasnada do universo morto, o cadáver rodante do espaço físico, o fim de todos os mundos flutuando negro ao vento, disforme, anacrónico, sem Deus que o houvesse criado, sem ele mesmo que está rodando nas trevas das trevas, impossível, único, tudo.
Poder saber pensar! Poder saber sentir!
Fernando Pessoa!
27 de fev. de 2009
25 de fev. de 2009

Eu sou um corpo enrolado em lençóis num domingo de manhã. Restos classicos de pesadelo e muita insônia. Eu amanheço sozinho e vou deixando os domingos me matarem. Vou me revirando na cama até cair. Arrastando os chinelos pela casa. Carregando meu pijama deprimente e uma xícara da moda. Eu sou um parasita do passado. Um clichê sem charme. Eu sou um rosto na janela olhando o parque. Sou um sofá amassado. Sou um disco de vinil decorando a estante. Sou ausente de mim. Deus abençoe as minhas lembranças.
jc
14 de fev. de 2009

Chamo a isto companhia.
Não à simples presença de alguém ao nosso lado.
Falo do entrelaçar de pernas, do uníssono do riso.
Falo dos olhares conspiradores, da telepatia.
Chamo a isto companhia.
Não à estúpida conversa para fazer algum tempo.
Mas sim às conversas infindáveis sobre tudo e coisa nenhuma.
Sobre sonhos, poesias, sentados num banco de jardim.
Chamo a isto companhia.
Não ao aperto que asfixia, e ao olhar para o relógio.
Mas falo do perder das horas, das loucuras, dos desvarios.
Falo das caminhadas sem destino, da relva ao pé do rio.
Chamo a isto companhia...
Gabriel Braga
13 de fev. de 2009

-Ta triste ne ... ?
-Nao sei oq tenho, energias em crise eu acho,
mas vai passar.
-Vc nunca desabafa, grita, chinga?
-Nao posso gritar e chingar os causadores da minha estagnação.
-E pq não?
-Ou pq nao estao aqui, ou pq me recuso a falar com eles novamente, ou pq os amo demais p tal coisa. E tb, pq no fundo a gente sabe, que tudo oq sentimos é culpa de nós mesmos, é essa consciencia que me mata ...e me silencia.
-Entendo... as vezes o silêncio é que grita, como hj, te sinto aflita-Vc nunca desabafa, grita, chinga?
-Nao posso gritar e chingar os causadores da minha estagnação.
-E pq não?
-Ou pq nao estao aqui, ou pq me recuso a falar com eles novamente, ou pq os amo demais p tal coisa. E tb, pq no fundo a gente sabe, que tudo oq sentimos é culpa de nós mesmos, é essa consciencia que me mata ...e me silencia.
-É só por dentro.
-Ao avesso?
-Carne viva.
jc

Minha cabeça tá pesando toneladas hoje, e a porcaria do meu coração deve ta crescendo, e a minha alma tambem, porque eu to sentido falta de ar e falta de espaço e falta de corpo pra tanto subjetivismo e ta tudo muito esmagadinho aqui, aqui dentro. Talvez se eu meditasse, se eu voltasse a rezar, se eu falasse com Deus ou Yemanjá ou...ou... Eu não sei. Não sei o que é isso que se sente nesses dias frios de verão.
jc
11 de fev. de 2009

Sente-se, acompanhe o meu show. Por um segundo eu serei o cara mais atormentado do palco. E em todos os minutos o melhor ator em cena. Eu penso em vc a cada gesto. E todos os gritos são para que me ouças em algum lugar do mundo ou na primeira fila. Ahhhhhhhhh, vc ouve a minha angustia amor? Vc ouve ela se debater dentro do meu peito como um latão velho rolando pela rua? Vc ouve ela passando barulhenta pelas minhas veias entupidas de rancor e saudade e vingança. Sente-se aqui, sinta o cheiro de raiva pelo ar. É bom demais. Doce demais. Observe as luzes do inferno brilhando em neon colorido atras das cortinas. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh, vc ouve a minha vozzzzzzzzzzzz? O meu silêncio gritando no camarim. Sente-se amor, é hora de aplaudir a sua obra. Loucos violinos, te assustam. Eles rangem dentro de mim. A minha glória é o seu medo. Apagam-se as luzes para o próximo ato.
jc

Quem sabe incendiar esses discos, quem sabe tacar fogo no colchão nos travesseiros nos lençois, quem sabe um pouco de gasolina nessa caixinha cheia de bilhetes, quem sabe uma fogueira com esses presentes. Quem sabe. Quem sabe a solução, a ilusão, o alívio imediato. Quem sabe a fumaça para disfarsar o perfume insistente. Quem sabe o sopro nessa queimadura de segundo grau, um desenho sobre essa marca que não sai no banho, na chuva, no gelo, no alcool, no amanhecer. Quem sabe um monte de cinzas.
Quem sabe um vento um dia.
jc
10 de fev. de 2009

Eu sou sim a pessoa que some, que surta, que vai embora, que aparece do nada, que fica porque quer, que odeia a falta de oxigênio das obrigações, que encurta uma conversa besta, que estende um bom drama, que diz o que ninguém espera e salva uma noite, que estraga uma semana só pelo prazer de ser má e tirar as correntes da cobrança do meu peito. Que acha todo mundo meio feio, meio bobo, meio burro, meio perdido, meio sem alma, meio de plástico, meia bomba. E espera impaciente ser salva por uma metade meio interessante que me tire finalmente essa sensação de perna manca quando ando sozinha por aí, maldizendo a tudo e a todos. Eu só queria ser legal, ser boa, ser leve. Mas dá realmente pra ser assim?'
tati bernardi

"Eu tenho um milhão de motivos pra fugir de pensar em você, mas em todos esses lugares você vai comigo. Você segura na minha mão na hora de atravessar a rua, você me olha triste quando eu olho para o celular pela milésima vez, você sente orgulho de mim quando eu solto uma gargalhada e você vira o rosto se algum homem vem falar comigo. Você prefere não ver, mas eu vejo você o tempo todo."
Tati Bernardi

"Essa vida viu, Zé. Pode ser boa que é uma coisa. Já chorei muito, já doeu muito esse coração. Mas agora tô, ó, tá vendo? De pedra. Nem pena do mundo eu consigo mais sentir. Minha pureza era linda, Zé, mas ninguém entendia ela, ninguém acolhia ela. Todo mundo só abusava dela. Agora ninguém mais abusa da minha alma pelo simples fato de que eu não tenho mais alma nenhuma. Já era, Zé. É isso que chamam de ser esperto? Nossa, então eu sou uma ninja. Bate aqui no meu peito, Zé? Sentiu o barulho de granito? Quebrou o braço, Zé? Desculpa!"
Tati Bernardi
6 de fev. de 2009

As coisas lá
Quando não estou no pêndulo insuportável de devorar ou vomitar, tenho meus minutos de contemplação. As coisas lá, eu aqui. As coisas lá. Eu aqui.
E quando entendo que posso gostar de cinema sem ver filmes o tempo todo, e gostar de sumir sem fazer sexo ou dormir o tempo todo, e gostar de livros sem ler o tempo todo e amar alguém sem estar com ele o tempo todo, entendo o mais maravilhoso de tudo: que eu posso ser eu sem falar nisso o tempo todo. E fim de papo.
Tati Bernardi

"Há pouco fiquei me olhando durante muito tempo no espelho. Tenho a impressão de que meus traços mudam todo dia. Ou não são bem os traços que mudam, porque o olho, o nariz, a boca continuam o mesmo. É uma coisa que está em todos os traços ao mesmo tempo, e ao mesmo tempo em nenhum."
Caio Fernando Abreu

Eu sei que nesta vida eu não vou me encantar com ninguem. Ninguem mesmo, ninguem. Tenho uma certeza calmissíma de que nessa dimensão pessoa alguma me surpreenderá, ou me fará sentir aqueles sintomas todos. Ah, energia energia energia. Eu fico com a cor, vocês com o amor. Dessa vez eu vim pra ficar em paz. Guerrilhem queridos, guerrilhem.
jc
5 de fev. de 2009

"Daquele tempo nem tão distante, daqueles dias que até hoje duram às vezes duas, às vezes duzentas horas, restou esta sensação de que, como eles, também me vou tombando rápido dentro da boca de um vulcão aberto sem fôlego nem tempo para repetir como numa justificativa, ou oração, ou mantra, enquanto caio sem salvação no fogo que é verdade, que si, que no, que nadie puede mismo vivir sin amor."
-Caio Fernando Abreu
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