31 de ago. de 2010

Que esse era o melhor jeito de chegar ao fundo: 
pelos caminhos transversos, pelas perguntas banais.






Caio F.
... uma das mãos cerradas com força e a outra estendida em direção ao espelho — como se pedisse socorro a qualquer coisa muito próxima, mas inteiramente desconhecida.

Caio F.
In O ovo apunhalado
– Você não passa de um substantivo feminino — disse, e quase sem sentir acrescentou - ... mas eu te amo tanto, tanto.
Recompôs-se, brusco. Não, melhor não falar nada. Admitia que não conseguisse controlar seus pensamentos, mas admitir que não conseguisse controlar também o que dizia lançava-o perigosamente próximo daquela zona que alguns haviam convencionado chamar loucura. E essa era a primeira vez que se descobria assim, tão perto dessas coisas incompreensíveis que sempre julgara acontecerem aos outros — àqueles outros distanciados, melancólicos e enigmáticos, que costumava chamar de os-sensíveis —jamais a ele. Pois se sempre fora tão objetivo. Suportava apenas as superfícies onde o ar era plenamente respirável, e principalmente onde os sentidos todos sentiam apenas o que era corriqueiro e normal sentir. Subitamente pensava e sentia e dizia coisas que nunca tinham sido suas.
Então, admitiu o medo. E admitindo o medo permitia-se uma grande liberdade: sim, podia fazer qualquer coisa, o próximo gesto teria o medo dentro dele e portanto seria um gesto inseguro, não precisava temer, pois antes de fazê-lo já se sabia temendo-o, já se sabia perdendo-se dentro dele — finalmente, podia partir para qualquer coisa, porque de qualquer maneira estaria perdido dentro dela.






Caio F.
Claro que me cuido, nem precisava pedir. Te cuida, dissera ele. E eu ouvi como se fosse um te amo."


(Martha Medeiros)

30 de ago. de 2010

Mas o que marcava e pesava mais era o intangível.






Caio F.
Não era evidente nem externo ou explícito o que padecia.




Caio F.
Morrer não dói. Morrer é entrar noutra. 




Caio F.
São Longuinho, São Longuinho 
Pra onde foi? 
A coragem do meu coração! 



[Teatro Mágico]

29 de ago. de 2010

Que triste não saber florir.




Alberto Caeiro

28 de ago. de 2010

só há uma forma de se estar perto
quando se está muito longe:
se fecha os olhos, bem forte,
e pensa e deseja muito, muito, muito
(...)


(Cáh Morandi)
Passo o dia inteiro pensando em você
Te imaginando de todas as maneiras, em mil lugares
Em todas as saudades que morro de ter
Te tiro e coloco na minha vida sem pedir licença
Assim como você invade minha cabeça
Faz da minha mente uma presa da tua face
Do teu cheiro e mãos que não tenho,
Mas tenho tanto para dar
Não só o pensamento
Também amor no peito
Acontecendo antes de você chegar





(Cáh Morandi)
"Os outros eu conheci por ocioso acaso. A ti vim encontrar porque era preciso."




(Guimarães Rosa)
...salto desesperadamente
para a esperança
.
.

(Cáh Morandi)
A pele é o lado de fora do sentimento.






Ana Jacomo
Se você quer ouvir, ouça. Mas não pergunte nada além do que eu direi, porque eu não saberia dizer, ou talvez não devesse.




Caio F.
'Muita gente diz que estou escrevendo cada vez mais para o nada. Quem me dera!'




Caio F.
Mas apesar das diferenças tinham algo em comum: eram loucos um pelo outro.




Caio F.
Foi esse sorriso que doeu. Doeu pelo resto da vida.




Caio F.
Refaço. Colo. Pinto e bordo. Porque a força de dentro é maior. Maior que todo mal que existe no mundo. Maior que todos os ventos contrários.




Caio F.
Se Deus quiser, um dia acabo voando.




Caio F.
- Quer fumar? - ofereceu, mas sabia que era como se dissesse qualquer coisa feito “não se dilacere sem necessidade, meu bem".






Caio F.
Há muito pra dizer, mas é uma pena que não se possa mandar uma carta cheia de silêncio, que é música;




Caio F.
Tem duas coisas me puxando, dois tipos de vida - e eu não quero nenhum deles. Quero um terceiro, o meu.




Caio F.

Desculpe tanta sede, tanta insatisfação. 
Amanhã, amanhã recomeço. Te espero, te gosto, te beijo.




Caio F.
(...)
Tenho medo de te ferir. Mas acho que precisamos “falar seriamente”. Desculpe, mas acho que sim, sem fantasia, sem comicidade. Me pergunto sempre se você não teceu em volta de mim uma porção de coisas irreais — se você não estará projetando em mim qualquer coisa como um príncipe encantado — esperando a minha volta como quem espera a salvação. Você diz que me ama. Eu digo que você não pode amar a uma pessoa com quem transou há três anos atrás, e que viu rapidamente num aeroporto, e que escreveu e recebeu cartas durante um ano. Verinha, sei lá, amor a gente transa cara a cara, corpo a corpo. Não sei se te amo. Saberei isso quando a gente se encontrar outra vez e começar a transar, e der certo ou não. 
Você fala em casar. Algum tempo atrás falei nisso talvez por romantismo, por solidão ou brincadeira, ou mesmo seriamente. Não quero casar. Casamento é uma coisa completamente estúpida — e sua explicação de comprar a aprovação das famílias não tem o menor sentido. Se você me amar e eu te amar, não precisamos da aprovação de ninguém para ficar juntos, como também não precisamos assinar nenhum papel ou aceitar qualquer espécie de jogo. Não acredito que maus fluidos, por mais fortes que sejam, consigam destruir um amor bonito, limpo. E um filho só teria problemas como fato dos pais não serem casados apenas no caso de ter sido educado muito caretamente — o que não acontecerá se um dia eu tiver um filho.
Há também uma outra coisa muito séria que você não pesou bem até agora. E sou muito franco com você: tenho um componente homossexual muito forte. Até hoje, minhas relações heterossexuais sempre foram, sei lá, meio idiotas — porque, realmente, aforavocê e uma outra garota gaúcha, M.,o corpo feminino é uma coisa que não consegue me entusiasmar. Nunca fui exclusivamente homossexual ou exclusivamente heterossexual — creio que nunca serei. Mas também me pergunto até que ponto você REALMENTE poderia aceitar isso em mim. Pense com você mesma e procure ser muito honesta na resposta. 
Verinha, estou mesmo voltando e tudo começa a ficar muito real. Não posso mentir a você, não quero, sei lá, que você entre numa errada comigo. Que você se machuque ou, como diziam minhas tias quando eu era guri, “tenha uma desilusão”. Mas a verdade é que ainda não quero me prender a nada, a nenhum lugar, a ninguém — a não ser que isso pinte com muita força, o que é impossível de acontecer por carta. Além disso, sou terrivelmente instável e entender as minhas reações é coisa que às vezes nem eu mesmo consigo. 
Não posso mentir a você, não quero. Mas por favor não fantasie, menina, não seja demasiado adolescente. Como eu te escrevi várias vezes, é no nosso encontro, cara a cara, olho a olho, que as coisas vão se definir. Veja se você consegue separar o sonho da realidade. Anel, por exemplo, é um sonho. É um sonho que trago comigo há muito tempo e que comuniquei a você — e que não é hora ainda de ser realidade, porque não tenho absolutamente nada além da minha cuca — você me entende? Minha profissão é essa coisa absurda de escritor, que não dá dinheiro nenhum, estou sempre recomeçando e recomeçando e recomeçando. É muito duro. Ontem por exemplo só tomei um café — hoje vai ser o mesmo. Eu agüento — mas um bebê, Vera?
Menina, menina, tenho uma ternura enorme por você — e para mim é muito difícil isolar essa ternura da razão, quando te escrevo. Como fiz agora. Talvez tenha te parecido duro ou demasiado frio. Mas acho, honestamente, que você não deve se arriscar a ter uma tremenda decepção, depois de um ano inteiro de sonhos. Nós vamos nos ver, nós vamos conversar, sair juntos, provavelmente nos tocar — e de repente tudo pode realmente ser. Ou não. Mas de jeito nenhum quero, sei lá, ser irresponsável ou não medir as conseqüências dum negócio que pode ser muito sério. 
(Não agüento de fome e de vontade de fumar. Volto já). 
Voltei. São 8.30, comi um sanduíche no grego, comprei cigarros no 
hindu e voltei cantando em espanhol (Perfídia). Londres é assim. 
Sabe que eu tô muito velho? Outro dia me deram 30 anos. A minha cara tá cheia de marca, ruguinhas. O meu olho caiu ainda mais e tem uma expressão de cansaço absoluto. O cabelo, que era minha maior “arma”, caiu muito, tem entradas incríveis e nenhum brilho. Rio pouco e quase não falo. Pense também nisso, tire a sua cabecinha da lua: você não vai encontrar nenhum modelo de beleza na sua frente. Europa marcou fundo, e aquele menino cheio de vida e acreditando em tudo que você conheceu em 71 ficou perdido entre pilhas de pratos e panelas sujas num restaurante sueco, no verão passado. Já não sou o mesmo, como você também não é. Endureci um pouco, desacreditei muito das coisas, sobretudo das pessoas e suas boas intenções. Dar um rolé em cima disso não vai ser nada fácil. E as marcas ficarão — tatuagens. 
Quero muito te amar e me encontrar contigo. Mas não sei se conseguiremos — e tenho medo. 
(...)






Caio F.
"Lembrei de uns versos de um poeta peruano (Será Vallejo? não estou certo): "Caminante, no hay caminos. Pero el caminho se hace al andar".




Caio F.
junho, julho, agosto adentro, enrolado em cobertores, vida afora repetindo "volta".






Caio F.
E sempre penso que pode ser esse agosto. Mês especialmente dado a essas feiúras (...)



Caio F.

22 de ago. de 2010

Não é necessário “escarafunchar a alma do outro” para se comunicar. 
Há o dito sem palavras, o silêncio dos diálogos.




Lya Luft
À porta do casebre, 
o meu coração vazio, 
o meu coração insatisfeito, 
o meu coração 
mais humano do que eu, 
mais exato que a vida.




Fernando Pessoa
Grande parte daquilo em que juramos acreditar 
pode ser somente crença alheia que a gente não passou a limpo.




Ana Jacomo
Talvez você pule esses três ou quatro muros que nos separam 
e segure a minha mão, assim, ofegante, pra nunca mais soltar.






Caio F.
Quero de novo o ventre de minha mãe, 
sua mão espalmada contra o umbigo estufado, 
me escondendo de Deus.







Carlos Drummond de Andrade


Será Deus uma criança muito grande? 
O universo inteiro não parece uma brincadeira, 
uma partida de criança travessa? Tão irreal...



Fernando Pessoa

O grande mistério dos egomaníacos (como eu):
falar sempre a mesma coisa e nunca faltar assunto.


Tati Bernardi

Eu não queria, eu não quero, dar trevas, dor, medo, solidão 
- eu quero dar e ser luz, calor, amparo ...




Caio F.
Sobre o sonho não falo, talvez você achasse ridículo, mas era bonito.




Caio F.
A vontade compulsiva de me atordoar 
cedeu à vontade compulsiva de ser simples, ser terra.




Caio F.
Divido o dia em três partes:
a primeira pra olhar retratos,
a segunda pra olhar espelhos,
a última e maior delas, pra chorar.


Adélia Prado
E afinal o que quero é fé, é calma,
E não ter estas sensações confusas.
Deus que acabe com isto! Abra as eclusas
- E basta de comédias na minh’alma!





(Fernando Pessoa)
Não perturbes a paz que me foi dada. 
Ouvir de novo a tua voz seria matar a sede com água salgada. 





- Miguel Torga.

"Eu não sentia nada. Só uma transformação pesável. Muita coisa importante falta nome." 






(Guimarães Rosa)
...Eu venho de uma longa saudade. Eu, a quem elogiam e adoram. Mas ninguém quer nada comigo. Meu fôlego de sete gatos amedronta os que poderiam vir. Com exceção de uns poucos, todos têm medo de mim como se eu mordesse." 






[C.Lispector]

'Já conheço os passos dessa estrada’... E, mesmo assim, estarei sempre pronto para esquecer aqueles que me levaram a um abismo. E mais uma vez amarei. E mais uma vez direi que nunca amei tanto em toda a minha vida. Direi.‘Vou colecionar mais um soneto, outro retrato em branco e preto a maltratar meu coração’...O que eu tenho, afinal? Saudades. Eu tenho saudades.”




Fernanda Young

21 de ago. de 2010

"Amar não é só bonito e, pra ser hora ou outra, é feio demais no caminho..."



Rani Ghazzaoui

(...) E eu não sinto o seu gosto 
porque o salgado continua por toda parte 
enquanto você não vem.



Rani Ghazzaoui
Acho que eu digo tantas bobagens porque sei mesmo que no final de tudo a gente não vai se perder. As minhas palavras são ásperas porque as minha emoções oscilam, mas é tudo só medo de te perder por algum motivo dessa vida e acabar tendo que me esconder nas minhas mentiras de novo pra, de novo, tentar encarar o sol sem ter você. É por isso que eu sempre seguro sua mão com força, é por isso que meu abraço às vezes te sufoca e que meu coração grita tão alto que te envergonha. A verdade é que eu tinha muitas teorias de liberdade e independência, mas é verdade também que eu, antes de tudo isso, nunca tinha entendido o que era mesmo o amor nessa vida.








Rani Ghazzaoui

20 de ago. de 2010

Mas sei: sempre sei que tudo isso não está mais do lado de fora: sei que já não bastaria abrir a janela: sei que não bastaria a janela. Como se minhas unhas crescessem e eu as cravasse no meu próprio peito. Digo para mim mesmo que não é preciso assassinar o que já está morto, mas enquanto dura a respiração dele, preciso continuar enterrando as unhas devagar na carne, afastando músculos e veias e ossos, como se escavasse a terra em busca de uma semente. 




Caio F.
Abracadabras, shazams. Talvez não fossem necessárias, porque eu estava carregado de amor por nós todos.
Falo banalidades, sei, mas amor é magia, condão, pedra de toque — embora o pressentimento da teia escura se armando sobre nossas cabeças.






Caio F
O tom, o problema é o tom.




Caio F.
Mas tudo isso é necessário? Tudo isso o quê? As explicações, as memórias, os mitos. Não sei, não sei, não consigo de outro jeito. Continuo esperando certa nitidez vinda de fora. Por enquanto, nesta outra cidade, ouço e vejo apenas o vento misturando terras, pólens, papéis, sementes, miasmas, folhas e histórias. Sopra mais forte na minha esquina sobre o abismo.




Caio F.
(...) já não era um gatinho novo ao sol damanhã, mas um animal ferido contraindo-se entre a dor das feridas e a tentativa de manter um equilíbrio qualquer ou captar um sopro capaz de evitar o desabamento da morte, da loucura e do ódio sobre cada uma das nossas cabeças.




Caio F.
Minha vida me doía fundo sangrada sem saída. Tudo que eu precisava era o sol quente da manhã seguinte que não viria, aquecendo minha cabeça confusa. Cobri o rosto com as mãos e comecei a chorar.


Caio Fernando Abreu
Respirar é uma oração que nada pede, Obá humilde. 


Caio F.

Somente um ódio suficiente é capaz
de vencer o medo para impulsionar o querer viver.





Educ. rev.  no.31 Curitiba  2008

Carmen Lúcia Fornari Diez

Outro conceito: da felicidade que rompe a ideologia viscosa da felicidade, aquele que, edificando o amor, movimenta-se em torno de um núcleo de dor. Conseqüentemente, o amor não traz a felicidade mas enche de vida a quem ama e alivia o cansaço de ser.Apenas expurgando os medos que torturam, exterminando as esperanças que iludem, arriscando-se, categoricamente, a despedaçar o «eu», é possível dizer que amar é a troca de nada. Quando se ama assim, quando se ama sem esperar nada, o amor se faz translúcido e se mostra como é.







Educ. rev.  no.31 Curitiba  2008

Carmen Lúcia Fornari Diez

"A vida se vinga com a vida a ser vivida"










PETIT
"Pensar o querer viver foi a maneira de continuar vivo. Se pensei o querer viver o mais longe que pude foi, pois, por necessidade, empurrado pela própria vida" 






(PETIT, 2005,p.11). 

19 de ago. de 2010

E a vida poluía. Carne gasta, já inatingível por qualquer palavra de ódio ou de amor, qualquer revolta ou qualquer alegria.


Caio F.
“Deixe-me ir. Preciso andar. Vou por aí a procurar. Rir prá não chorar.”



 - Cartola
Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como uma cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.

Estou por assim dizer 
vendo claramente o vazio
E nem entendo aquilo que entendo
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço

Além do que:
O que faço dessa lucidez?
Sei também que essa minha lucidez 
pode-se tornar o inferno humano 
-já me aconteceu antes.




(Clarice Lispector)
"O que define um ser humano 
é o telencéfalo altamente desenvolvido, 
o polegar opositor e a liberdade." 



Ilha das Flores

  

Vou embora. Aqui meus crimes não seriam de amor
 Vou embora para os meus outros crimes, 
os que Deus e eu compreendemos...



C. Lispector.