30 de mar. de 2011

‎"Em última instância tudo deve ser como é e sempre foi. As coisas grandes estão reservadas para os grandes, os abismos para os profundos, as delicadezas e os arrepios para as almas delicadas e, de um modo geral, tudo o que seja raro, para os incomuns." 


Nietzsche
Educação para a vida deveria incluir aulas de solidão.




Mauro Santayama

20 de mar. de 2011

Você não sabe como tenho me sentido cansado, terrivelmente cansado... como tenho tomado café em excesso para manter os olhos abertos diante de uma vida que eu não quero ver. 
Dor nas costas, olheiras, estou pálido... e sei que são os dias que estão pesando, e a falta de sol, não tenho saído daqui, fico roendo paginas e mais paginas, fico calado, fico confortável dentro deste ciclo suicida disfarçado de sonolência.
Lixo, lixo, estou acumulando montanhas de um luxuoso lixo cult, quem sabe para perder a memória sobre outras coisas, coisas vivas, coisas de carne e osso, matéria, química, cheiro. Cultura não apodrece, as pessoas, sim. Tenho medo da perda? 
Depois tomo chás, muitos, para acalmar meus instintos humanos, não gosto deles, não sei usar, 
não sei reparti-los, se pudesse os jogaria de cima do mais alto prédio que encontrasse, mas não de qualquer jeito, não simplesmente empurrando, chutava-os! Masoquista? Sádico? Louco? Triste.
Não, você não sabe de que tamanho pode ser uma saudade.


jc

19 de mar. de 2011

Amigos são, sim, para trocar abismos — então me escreva 10, 100 páginas, e eu responderei com toda amizade que realmente sinto por você.






Caio Fernando Abreu 

Mais de um ano... fiquei pensando -  sozinho aqui no quarto - como é gratificante, no agora, perceber alguns fiapos de recuperação. Mudei tanto a minha vida, fui radical comigo mesmo, fui bruto, e ao mudar eu pensei que não suportaria, talvez quase não suporte. Tão difícil recomeçar.
Mas há um momento em que não adianta mais ficar, não adianta mais ser o mesmo homem enfeitando a sala, nem ter o mesmo outono na janela, dizer os mesmos nadas, fazer, ver, respirar, abraçar os mesmos sempres de sempre, décadas, uma, duas, três, e logo mais: mais.
A mudança traz uma revolta gelada, solidão da mais negra e nebulosa, me senti até arrependido em alguns momentos. Mas era disso que eu precisava, o choque, e mesmo que faça o caminho de volta um dia, me foi necessário ter vindo parar aqui, no hoje.
É mesmo extremamente lento se transformar sem auxílio, mudar sem ajuda, sem grandes empurrões, sem significativas indicações de caminho. Tenho tentado, e dentro da tentativa começa brotar um modesto orgulho por estar tentando e estar conseguindo ainda que miserávelmente.
Meus passos ainda estão atrapalhados, cambaleio como uma criança sem colo, sem mãos de adulto estendidas, e tem dias em que caio, caio fundo no fundo escuro de mim, me despedaço todo e dói muito, mas vou levantando outra vez, porque não há outro jeito - muito cedo para a morte.
Dias de salto em altura, dias de arrasto, de suar frio e ter medo de não chegar nunca num bom lugar.
A vida crava os dentes da realidade no meu pescoço, nessas grossas veias onde correm sonhos re-sonhados... e suga tudo, me deixa sem nada de nádaras e lá vou eu re-re-sonhar.
Me equilibro na ponta dos pés à beira do poço, me sustento suspenso, me reafirmo, me faço firme, me contabilizo, eu me rezo, e apesar dos apesares cuido de mim. Muito. Principalmente para manter trabalhando essa força que eu gasto para me suportar, suportar os outros, e suspirar os meus-ideais-falidos-tão-lindos.


jc
Tenho pedaços de lonjura dentro do peito.


jc

18 de mar. de 2011

Espera, também-não-é-tudo-assim-escuridão e morte.




Caio Fernando Abreu.

16 de mar. de 2011



Agridoce março. Mais azedo do que doce, talvez março seja uma prévia dos angustiantes agostos, algo assim para evitar nosso susto ali na frente, afinal, você sabe que o tempo engana, e de um agosto até o outro parecemos ou fingimos esquecer muitos azedumes; 

Enfim, março está aí, amostra grátis de tragédias naturais, nucleares, e principalmente tragédias internas, catastrofes anunciadas, ou não, desde a infância, desde o berço, desde o início de toda paranóia que é viver 86.400 segundos todos os dias.

Não, não estou escrevendo para os 'felizinhos' de plantão, que acham todas as angústias uma bobagem, estou escrevendo para quem já nasceu com todos os sentidos aguçados, mas tão aguçados que quase tudo dói.

Amaldiçoaremos março por aumentar ainda mais a nossa tentativa covarde de fuga, ou agradeceremos por ele aquecer nossos músculos nessa esticada corrida de baratas tontas sob o céu? ...

... Aliás, sempre achei o céu um grande camarote de circo, os deuses ali rindo da nossa fraqueza, esperando, auxiliando, ou atrapalhando, para que aprendamos a andar na corda-bamba sem morrer, para que não tenhamos mais medo de sermos lançados do canhão para o espaço, ou para que giremos quase suicidas no globo da morte e mesmo assim, além de todos esses "malabarismos" possamos sempre ter algo amortecendo a queda ou estrelinhas brilhantes no vácuo ou uma inexplicável adrenalina que compense tudo. 

Espero que todos tenham mesmo capacidade de respirar Cirque du Soleil, mesmo quando sentados em tábuas podres numa arquibancada pequenina debaixo de uma lona velha cheirando umidade, mofo 
e com sorte alguma esperança, 
essa lona desbotada de tantos marços e agostos.

- Respeitááááável púúúblico, aí vem o veloz abril, de velocipede, a pipoca de maio, a maçã-do-amor de junho, em julho tem palhaçada, tem sim senhor... 

Setembro tem desfile, outubro tem presente, novembro um certo alívio e dezembro, doces mentiras... afinal não queremos criancinhas chorando por aqui, não é!?

Janeiro tem viagem, fevereiro carnaval, para os adultos também não desistirem do espetáculo!

Um VIVA ao gigante picadeiro!!!!



jc



"Alguém baixou com suavidade minhas pálpebras, 
me levando, desprevenido, a consentir num sono ligeiro,
eu que não sabia que o amor requer vigília."



Raduan Nassar

"Os olhos no teto, a nudez dentro do quarto; 
róseo, azul ou violáceo, o quarto é inviolável."



Raduan Nassar

Caminhais em direcção da solidão. Eu, não, eu tenho os livros.




Marguerite Duras

14 de mar. de 2011

"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranqüila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: “Se eu fosse você”.
A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção."





Rubem Alves 


in “O AMOR QUE ACENDE A LUA

Eu corto o mal pelas flores.


[Tati Bernardi]

10 de mar. de 2011




Não tenho certeza se foi num carnaval ou numa quarta-feira de cinzas - tropeçando no lixo que sobrou - que o Brasil perdeu a dignidade. 
Eu acho mesmo que o país dá a bunda, paga pau, e ressalto: ganha mal. 
E fica grávido. Grávido de mijo, vômito e boletins de ocorrência. 
Parabéns, Brasil, deu positivo, vamos parir! Vamos parir pelas narinas o cheiro nojento que ficou. Vamos parir revistas e capas de jornais cobertas de purpurina suada, sangrada, capotada nas BR's. Vamos parir a porra da porra! Vamos parir lágrimas quando as estatísticas (dos óbitos) sambarem na porta da nossa casa! 
Mas o que importa?, mal terminou e já recomeçou, mais um pré-natal vem aí! Gestação, fórceps, incubadora, prematura a nossa fantasia. 


jc

9 de mar. de 2011



Sob o guarda-chuva da palavra amor cabem muitas outras coisas. Umas o tempo constrói, outras ele esfarela. E enquanto os dias chovem eu olho tão profundo para a sua foto e fico te repetindo essas frases de justificativa e medo. Frases que se aprende na perda. 

Esperei que você esperasse. Acho que você também já esperou isso de mim, um dia. E de tanta urgência e falta de esperas a gente se foi, um do outro. Fui embora correndo tanto, tanto, tanto que você nem pode imaginar como doeu o meu corpo inteiro, a cabeça também, o coração. Vontade de parar, de gritar e voltar e descomplicar tudo aquilo. E ter você, e dentro do ter você respirar com calma outra vez, e ficar parado fundo dentro do teu peito que é abraço para então andar devagar todos os dias na sua direção.


jc


8 de mar. de 2011

"Pouco antes de dormir, percebo que ainda estou sorrindo. E que não sinto alegria. Afrouxo um por um os músculos do rosto, do corpo, da mente. Depois afundo."



Caio F.
“Caí em meu patético período de desligamento. Muitas vezes, diante de seres humanos bons ou maus igualmente, meus sentidos simplesmente se desligam, se cansam, eu desisto. Sou educado. Balanço a cabeça. Finjo entender, porque não quero magoar ninguém. Este é o único ponto fraco que têm me levado a maioria das encrencas. Tentando ser bom com os outros, muitas vezes, tenho a alma reduzida a uma espécie de pasta espiritual. Deixo prá lá. Meu cérebro se tranca. Eu escuto. Eu respondo. E eles são broncos demais pra perceber que eu não estou mais ali."

Charles Bukowski
Anjo-da-guarda é papo quente. Se bem que alguns são meio vadios e nem sempre cumprem horário integral.




Caio F.

6 de mar. de 2011

Ser estúpido, egoísta e ter boa saúde, eis as condições ideais para se ser feliz. Mas se a primeira vos falta, tudo está perdido.




Gustave Flaubert

A recordação é a esperança do avesso. Olha-se para o fundo do poço como se olhou para o alto da torre.




Gustave Flaubert

De onde vinha, pois, aquela insuficiência da vida, aquêle apodrecimento instantâneo das coisas em que se apoiava?... Mas se existia, fôsse onde fôsse, um belo e forte, uma natureza valorosa, cheia ao mesmo tempo de exaltação e de requintes, um coração de poeta com forma de anjo, lira com cordas de bronze, desferindo para o céu epitalâmos elegíacos, por que acaso não encontraria ela? Que impossibilidade! Nada, afinal, valia a pena procurar-se; tudo mentia! Cada sorriso ocultava um bocejo de enfado, cada alegria uma maldição, todo prazer o seu desgôsto, e os melhores de todos os beijos não deixavam nos lábios senão uma irrealizável ânsia de voluptuosidades mais intensas.


Gustave Flaubert

5 de mar. de 2011

Ah Deus, que os humanos vão guardando dentro de si tudo e todos que se perdem o tempo todo sem parar, e pode doer, pode doer, eu aviso, mas não deve, não, não deve: te digo que é assim que as coisas são e o fugaz delas é a sua eternidade - não no real, mas na memória de quem lembra (...)




Caio F.
"…Entende, entende bem, meu caro senhor, o que significa não ter mais aonde ir?”

”…Porque todo homem deve ter um lugar aonde ir…"









Dostoiévski
“Iniciei mil vezes o diálogo. Não há jeito. Tenho me fatigado tanto todos os dias vestindo, despindo e arrastando amor, infância, sóis e sombras”.

(Hilda Hilst)

"Pois amor é feito espelho: - tem que ter reflexo." 

Pablo Neruda
O leve tédio suspenso como poeira espanada logo voltava a desabar.


[Caio F. Abreu]

4 de mar. de 2011

'Uma vida sem sustos. É o que desejo pra mim.
Não estou dizendo uma vida sem decepções,
frustrações ou êxtases: sem sustos apenas.
Quero aceitar a potência dos meus sentimentos 
e não ficar embaraçada diante de reações incomuns.
Poder receber uma ventania de pé,
mesmo que ela me desloque de onde eu estava.
De pé, mesmo com medo.'




Martha Medeiros

2 de mar. de 2011

Então sorrir e afastar com delicadeza as inúteis durezas até que nos aproximemos (...)



Caio F.


Hoje ouvi alguém exclamar um agudo "estou farto", ouvi assim de longe, ouvi porque era pra ouvir mesmo, e me deu uma vontade tão súbita de gritar como num éco que ele não saberia jamais de onde veio que eu estava farta também, que me cansava acordar e estar só, ir dormir e estar só, respirar o dia e vagar só por dentro dele, ou por fora, afinal eu me sentia meio fora da órbita geral de fato.
Mas é claro que eu não gritei. É claro que eu continuei só por dentro e por fora. E continuarei.
É claro que era de mim mesma que eu devia estar cansada. Cansada dessa falta de ousadia que me mastiga inteira. Me falta coragem até pra pirar de vez... Me falta a fuga toda sabe, a droga que eu nunca usei, o sexo sem muito porquê que eu nunca fiz, o palavrão, o urro, o uivo. Me falta a briga, comigo, com o mundo, com.
Mas eu estou farta de estar farta e então o que na verdade eu gritaria? É sempre muito difícil berrar nossas vergonhas.



jc

(...) nem eu nem tu saberíamos dizer de quem partiu o início do gesto, a mão de um tocaria redondaleve a pele do rosto do outro para que começasse a acontecer tudo aquilo de beijos e suores e salivas e gritos de prazer, misturados num sonho não sei se meu o teu / meu corpo que já não sabia até onde era meu ou teu, sentindo sempre, desde antes do início do gesto, de toque, que não haveria depois (...)


Caio F.
Ela é, sabe que é, mas não exibe nem constrange.




Caio F.
...transita numa carreira de impecável coerência com sua própria criatura: dividida em mel e espada.




Caio F.