17 de dez. de 2009





Todo mundo tem segredos. Ou pelo menos as pessoas interessantes. Nada mais chato que alguém mapeado, retilíneo, constante, doce, amável. Pra mim só vale a pena quem tem um cadáver no armário, uma sombra perigosa, um poço fundo. Não há muito o que aprender com quem nunca se arriscou. Nada a dividir com quem jamais saiu da segurança do previsível.
Por mais cruel que soe, o que desperta a curiosidade, suscita encantamento, não é a simpatia avalassadora ou a educação exemplar. O que faz nascer um certo feitiço é a falta de obviedade. Não é à toa que os mitos não nascem de águas claras mas sim da dualidade, da pouca incidência de clareza. Somos inerentemente fascinados pelo o que não entendemos, amamos o desconhecido com um amor tão lancinante quanto arriscado é por isso mergulha-se à noite, escala-se o Himalaia, tira-se férias no Japão, come-se fora de casa. São todas tentativas de descobrir temperos que despertem o paladar em vidas insípidas. É só quando ultrapassamos a barreira do familiar, do seguro, que nos tornamos verdadeiramente pessoas. Menos ingênuas mas completas. Mais complicadas mas com um impagável autoconhecimento. Um tanto inescrutáveis, o que pode incomodar os mais rasos mas infinitamente mais interessantes. Ter segredos é efeito de viver intensamente, a prova de que a realidade pode ser muito mais significativa do que nossos forçados sorrisos de bom-dia, o escritório claustrofóbico, o saldo negativo.
É ter coragem de arcar com o peso de ser único, independentemente de nossos atos serem louváveis ou não. Porque quem não se arrisca, não faz besteira e não erra, não vive, apenas desperdiça o sagrado tempo que deveria ser aproveitado com paixão. Apenas caminha, sem deixar pegadas, sobre os dias, rumo à morte.”





(Ailin Aleixo)